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Vez por outra, atendo pacientes que, segundo seus tutores, sempre foram “enjoados para comer”, por vezes desde filhotes. Isso é surpreendente, uma vez que os cachorros são naturalmente vorazes. Os filhotes, devido à fase de crescimento, são ainda mais alucinados por comida. Essa constante disposição para comer é uma herança do lobo, que, sem saber quando conseguirá abater uma presa, devora até carcaças em estado de putrefação.

Mas, afinal, o que pode explicar a falta de interesse nas refeições por parte de alguns cães ou gatos?

Alguns indivíduos simplesmente não ligam muito para comida. Quando atendo cães das raças Husky Siberiano, Pastor Alemão e Yorkshire Terrier, por exemplo, percebo uma tendência a um apetite diminuído ou inconstante, embora haja indivíduos com comportamento alimentar normal. Cães visivelmente saudáveis que comem pouco não me preocupam; encaro isso como uma característica, da mesma forma como algumas pessoas naturalmente comem pouco.

Em casos assim, minha abordagem é tranquilizar os tutores quanto aos hábitos que o próprio animal tenta estabelecer e que podem ser respeitados. Isso inclui a possibilidade de servir uma única refeição ao dia e até mesmo deixar o cão pular completamente refeições esporadicamente. Recomendo uma dieta palatável para o animal e mais densa em calorias e nutrientes de maneira a compensar o consumo de menos alimento. Além disso, sugiro servir a refeição no final da tarde, no lusco-fusco, quando a fome tende a aflorar.

Uma situação diferente ocorre quando o peludo nunca deu trabalho para comer e subitamente perde o entusiasmo pelas refeições. Nesses casos, geralmente é mais fácil identificar e contornar as razões por trás da redução do apetite. Por fim, existem cães e gatos que não se alimentam bem devido a problemas de saúde que merecem investigação, como dor nos dentes, na coluna, ou desconforto digestivo, como azia, refluxo gastroesofágico e cólica.

Conviver com um peludo que come pouco, seja esse um comportamento crônico ou recente, pode gerar muitas dúvidas e inseguranças. Confira abaixo as principais causas para o seu pet estar “chato para comer”.

Mude a dieta

O problema pode ser a dieta em si. Conheço muitos cães que desde filhotes não gostavam de comer ração. A tutora trocava de marca, sem efeito. O peludo só começou a comer com gosto quando passou a receber Alimentação Natural (AN). Da mesma forma, os cães podem enjoar se a dieta, mesmo sendo natural, nunca for variada. E podem passar a preferir refeições servidas levemente aquecidas, trituradas ou, ao contrário, pedaçudas. Detectar as preferências dos pets é uma tarefa dos tutores. 😇

Fatores ambientais

Fatores ambientais, como dias muito quentes, podem afetar significativamente o apetite, principalmente pela manhã e no início da tarde. O estresse também é um inimigo do apetite, especialmente para gatos. Garantir um ambiente tranquilo e agradável durante as refeições, sem interferências de crianças ou outros animais, é essencial. Cadelas em período de cio frequentemente reduzem o consumo, afetando também os machos não castrados que convivem com elas.

Excesso de alimento

Este ponto é crucial. Cães e gatos que recebem mais comida do que necessitam podem desenvolver um paladar exigente. O excesso de comida leva ao sobrepeso e à obesidade, agravando a seletividade alimentar. É comum observar pets gordinhos que escolhem apenas a carne, ignorando outros alimentos na tigela, como vísceras e vegetais. É essencial controlar as porções e moderar os petiscos, mesmo que sejam opções saudáveis.

Manejo

Aqui está o meu puxão de orelha aos tutores que, sem intenção, estragam o paladar dos seus peludos. Ao mais leve sinal de desagrado do pet com a comida lá vai o tutor servir algum alimento ultra palatável e viciante, como pão, biscoitos e bifinhos. Alguns tutores oferecem um prêmio pelo peludo comer sua refeição, que deveria ser um prêmio por si só. Contextos assim podem gerar pets que terão dificuldade de aceitar uma dieta regrada e balanceada.

Idade

Por estarem em fase de desenvolvimento, filhotes e jovens são naturalmente mais esfomeados do que adultos. Minha gata, a Lenù, era insaciável quando filhote – voava em tudo que eu estivesse comendo, fosse cogumelo, abacate, ovo mexido, abóbora. Se tornou uma adulta bem moderada. Por questões diversas – dor, dificuldade olfativa, mudanças metabólicas – pets geriátricos podem ficar caprichosos para comer. Aquele cão ou gato que adorava carne cozida pode agora preferi-la crua – e vice-versa.

Problemas de saúde

Seu cão ou gato sempre comeu bem e de repente está desinteressado pelas refeições? É hora de conversar com a médica-veterinária. Causas para uma súbita perda de apetite incluem dor nos dentes, na coluna ou nas articulações, febre, infecção, anemia, gastrite, duodenite, cólica, refluxo gastroesofágico, náusea, constipação, “nariz entupido”, doença renal crônica e Síndrome de Addison (hipoadrenocorticismo). Quimioterapia e antibiótico são fármacos que também podem abalar o apetite.

Sedentarismo

Na natureza, a fome é a motivadora da principal atividade física dos canídeos e felinos: a caça. Corta para os dias atuais, com comida garantida diariamente, independentemente de qualquer esforço. Pets com apetite reduzido em geral se alimentam melhor depois de passear ou brincar. Experimente! Antes de servir a comida do gato, por exemplo, reserve 15 minutos para brincadeiras. O mesmo vale para cães, que se beneficiam de passeios de pelo menos 20 minutos antes das refeições.

Palatabilidade

Torne a dieta mais atraente adicionando caldo de ossos ao preparo dos alimentos ou como “molho” sobre a refeição. Se a dieta não contém ossos, sirva aquecida (na frigideira com um pouquinho de ghee, manteiga, óleo de côco ou azeite é sucesso). Adicione uma pitadinha de sal – é permitido, salvo para cardiopatas – e/ou ervas ao alimento. Quando possível, prefira uma dieta com mais carnes e menos vegetais. Se a adição do suplemento estiver sendo a causa da rejeição, busque alternativas.

Recapitulando

Se seu cão ou gato tem apetite seletivo:

  • Ajude-o a emagrecer, caso esteja acima do peso
  • Garanta atividade física diária
  • Proponha alimentação após exercícios
  • Reduza ou elimine petiscos
  • Varie composição e apresentação da dieta
  • Considere uma única refeição diária (apenas para adultos saudáveis)
  • Esteja atento a outros fatores (estresse, temperatura, ciclo reprodutivo)
  • Consulte um veterinário para investigar possíveis problemas de saúde

Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

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