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Faz tempo que queremos fazer essa postagem. No site do Cachorro Verde mantemos há mais de uma década artigos sobre protocolos vacinais sensatos para cães, atualizados e livres de excessos. Mas sobre gatos ainda não publicamos nada.

No mês que vem vai fazer 10 anos que co-redigi, com o Prof. Dr. César Dinóla, microbiologista veterinário da USP, um artigo publicado no periódico científico “Clínica Veterinária” sobre novas diretrizes vacinais para cães. Esse é um assunto querido para mim, quase tanto como a Alimentação Natural (AN). Mas bem ao contrário da AN, que avançou absurdamente no Brasil na última década, a questão das vacinas continua lamentavelmente estagnada.

Três questões, a meu ver, emperram a imunização de pets de ser atualizada por aqui: receios de que protocolos adotados no exterior não sejam aplicáveis à nossa realidade de país em desenvolvimento, falta de informações científicas sem (ou com menor) viés comercial e, claro, interesses da indústria.

Foi pensando nesses três pontos que, para embasar a nossa conversa de hoje, me baseei nas recomendações do boletim de 2020 que a entidade WSAVA (Associação Mundial de Veterinários de Pequenos Animais) publicou considerando os desafios que a vacinação de cães e gatos enfrenta nos países da América Latina.

Entre 2016 e 2019 o Grupo de Diretrizes de Vacinação dessa entidade visitou o México, Argentina e o Brasil e verificou o quanto nossa conduta vacinal está defasada. Muito desse atraso se deve a limitações inerentes a países em desenvolvimento, como falta de investimento para pesquisas, profunda desigualdade social e precarização dos serviços veterinários (grande parte dos pets é vacinada por balconistas de lojas). Mas também verificaram que seguimos usando vacinas descontinuadas há anos na Europa e Estados Unidos por sua ineficácia (como a de giárdia) e que faltam vacinas com menos agentes (que permitem aos veterinários individualizar o programa de vacinação do paciente).

Em seu boletim, a entidade conclui: já sabemos que a maioria das vacinas gera proteção duradoura. Vacinar repetidas vezes o mesmo animal com todas as vacinas todo ano faz pouco sentido. Precisamos ampliar a cobertura vacinal (vacinar mais cães e gatos), vacinar adequadamente (produtos de qualidade e bem conservados, aplicados por veterinários) e pressionar fabricantes de vacinas e autoridades por vacinas e leis atualizadas.

Vacinas são parte fundamental do cuidado com um pet. Mas podemos (devemos) imunizar de maneira mais individualizada, segura e ética – esse é o ponto aqui. E, sim, publicarei um post com as recomendações da associação sobre a vacinação de cães.

Doenças felinas vacináveis

  • Panleucopenia Felina: em filhotes e gatos imunocomprometidos essa virose pode causar anemia e redução das células de defesa, diarréia, vômito, febre, sintomas neurológicos e óbito.
  • Complexo Respiratório Felino: há vacina contra três microorganismos que causam essa doença – calicivírus felino, herpesvírus felino tipo I e a bactéria Chlamydophila felis.
  • Leucemia Felina (FeLV): compromete as defesas naturais contra vírus, bactérias, fungos e favorece o surgimento de câncer.
  • Raiva: doença viral zoonótica que acomete o sistema nervoso central e é geralmente fatal.

Classificação das vacinas

  • Vacinas Essenciais são aquelas que todo gato deve receber, independentemente de onde e como vive: a contra raiva, panleucopenia, herpesvírus e calicivírus. É o combo da vacina tríplice.
  • Vacinas Não-Essenciais são aplicadas com base em uma análise de custo:benefício, considerando a prevalência da doença na região, sua gravidade e o risco do gato contrai-la: Chlamydophila felis e Leucemia Felina. A vacina quádrupla protege adicionalmente contra a Chlamydophila felis. E a vacina quíntupla, contra a leucemia.
  • Vacinas Não-Recomendadas são aquelas sem uma sólida comprovação científica de eficácia preventiva: giárdia, Microsporum canis e coronavírus felino.

Protocolo da WSAVA para gatos

Gatinhos filhotes devem tomar uma dose da vacina tríplice entre 6 e 8 semanas, e então, a cada 2-4 semanas até os 4 meses de vida ou mais. O reforço é aplicado um ano depois ou aos 12 meses de idade do gato.

(Vale a mesma recomendação quando o veterinário julga indicado aplicar a quádrupla ou a quíntupla no lugar da tríplice.)

Gatos adultos geralmente não precisam tomar essas vacinas mais frequentemente que a cada três anos. Mas o felino com acesso à rua ou que fica hospedado em hotelzinho pode ser candidato ao reforço anual contra o herpesvírus felino e o calicivírus felino.

A vacina antirrábica é aplicada a partir dos 3 meses de vida e o primeiro reforço é dado um ano depois ou aos 12 meses de idade do gato. Vacinas antirrábicas de marcas importadas são licenciadas para aplicação a cada três anos nos Estados Unidos e países da Europa. Aqui, as mesmas vacinas estão licenciadas para aplicação anual e nossa legislação, que ainda não foi atualizada, exige o reforço anual.

Adotei um gato adulto e não sei se está imunizado. Como vaciná-lo?

Em geral, para gatos acima de 5 meses de idade basta uma dose da vacina tríplice e da antirrábica. Se a vacina indicada pelo veterinário for a quádrupla (que protege também contra a Chamydophila felis) ou a quíntupla (que protege também contra a FeLV), aplica-se duas doses intervaladas a 2-4 semanas. Importante: antes de vacinar contra FeLV teste o gato para essa virose, pois não há vantagem em vacinar contra a leucemia um gato positivo.

Devo vacinar minha gata gestante?

Salvo quando a bula da vacina informa o contrário, não é recomendável vacinar a gata prenhe por haver potencial teórico de risco aos fetos.

Tudo bem concluir a série de vacinas do filhote com 3 meses?

O ideal é concluir a série de vacinas do gatinho aos 4 meses, o mais próximo possível disso ou até um pouco à frente. Isso, porque até por volta de 4 meses de vida o gatinho apresenta anticorpos adquiridos da mãe que interferem com a ação da vacina É quando os anticorpos maternos não estão mais presentes que a vacina gera todo o seu potencial de proteção.

Existe exame de titulação de anticorpos vacinais para gatos?

Existe, mas está longe de ser a ferramenta valiosa que é no caso da vacinação dos cães. É possível testar a proteção vacinal contra raiva, mas o exame se destina somente a gatos que viajarão ao exterior. E para a panleucopenia felina, mas o teste ainda não está disponível no Brasil.

Como reduzir o risco do “sarcoma vacinal”? O sarcoma no local da injeção em felinos é um câncer agressivo, induzido por perfurações do tecido subcutâneo dos gatos. Qualquer injeção, não somente a vacina, pode gerar a inflamação que culmina nesse quadro. O WSAVA recomenda vacinas sem adjuvante (elemento que potencializa a produção de anticorpos), não vacinar além necessário e que os locais de injeção sejam revezados a cada aplicação e registrados na ficha do gato.

Por que no Brasil não existem vacinas de uso trienal?

Ficar revacinando um gato já imunizado não aumenta o grau de proteção, mas aumenta o risco de reações adversas.

O protocolo vacinal de pets em países europeus e nos Estados Unidos foi atualizado à luz das publicações científicas por forte pressão da comunidade veterinária e dos tutores sobre a indústria. As diretrizes do WSAVA para a América Latina reforçam que devemos seguir esse exemplo.

O texto completo em português você pode conferir aqui: https://wsava.org/wp-content/uploads/2020/08/Recommendations-on-vaccination-for-Latin-American-small-animal-practitioners-Portuguese.pdf Ele traz informações detalhadas, porém acessíveis, a médicos-veterinários e a tutores.

Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

 

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

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